Naquele dia de maio de 2012, Victor Martins de Oliveira estava no meio do ensaio. Fora convidado a integrar uma das dez duplas de palhaços Patati Patatá, que se apresentam em shows e eventos por todo o Brasil. Ele fazia o Patati e ensaiava a musiquinha (que sabe de cor até hoje) quando seu celular tocou. Atendeu. Era da O2, produtora de filmes e comerciais: vai ter um teste para sósia do Neymar e precisamos da foto do seu pé, tem como mandar?
Victor fotografou os pés no mesmo instante com o próprio celular e enviou à produtora. Ele não sabia que passaria no teste do comercial e veria pessoalmente, pela primeira vez, o garoto prodígio do Santos Futebol Clube. Mas não é exatamente assim que a história começa.
Dezoito anos antes, em 23 de maio 1994, Maria Aparecida deu à luz o menino Victor na cidade de Barueri, Grande São Paulo, onde sempre viveram. Meu filho era meio destrambelhado para dançar quando pequeno, e não tinha muito jeito para tirar foto. A desinibição cresceu na velocidade com que ele atingiu seu 1,86m de altura e, hoje, Maria diz que o rapaz adora aparecer na internet, tem cara de artista, porte de modelo e é muito, muito vaidoso. Ele confirma a opinião da mãe: minha mania é estar sempre me olhando em reflexos. Em qualquer reflexo. Eu ando na rua assim. Se tiver carro estacionado é uma maravilha, porque eu passo me olhando nos vidros.
Mudança
Até os dezessete anos de idade, Victor tinha um estilo tradicional. Definia seu cabelo como normal, usado assim, cortadinho. Em 2011, tudo mudou. Ele andava com uma turma de amigos descolados, estilosos, e para se integrar perfeitamente, decidiu seguir o padrão do grupo.
Deixou o cabelo crescer, mas não como os de roqueiros, não, nada a ver com isso. Parou de cortar os fios para poder usá-los arrepiados, contrariando a lei da gravidade, modelados com a pomada Rehidratt. Como arremate, descoloriu, fez luzes. Estava integrado. Quando os amigos saíam juntos para passear, era um negócio que chamava a atenção. Sabiam que aqueles cabelos eram como imãs de todos os olhares, e Victor, mais ainda. Foi nessa época que ele reparou: comentários sobre sua aparência – Olha aí o Neymar de cabelo grande! – começaram a ficar frequentes. Sempre alguém comentava, fosse amigo ou desconhecido. Talvez porque a semelhança vá além das madeixas. De certo ângulo oblíquo, assim meio de cima para baixo, olhando de perfil, a semelhança de traços do rosto de Victor com os de Neymar é evidente. Os olhos amendoados do sósia tambem remetem aos do craque. E pode ser ilusão de ótica, mas a pele de Victor realmente parece feita da mesma matiz que a do jogador.
Um dia, depois de tanto ouvir sobre sua semelhança, ele resolveu cortar o cabelo moicano, só para ver se ficaria mesmo igual ao Neymar. E pelo jeito ficou. Logo depois que saí do cabeleireiro, eu fui num parque de Barueri. As pessoas me olhavam, veio gente pedir para tirar foto, lembra Victor.
A primeira ligação
Uma das diversões mais frequentes do grupo de amigos era participar de programas de televisão – na plateia, claro. Eles partiam de Barueri em caravana e assistiam tudo ao vivo. Uma vez, em setembro de 2011, no programa Melhor do Brasil, da Record, o organizador de uma das várias caravanas presentes precisava resolver um problema e perguntou se alguém tinha Nextel para emprestar. Victor nunca vira o homem na vida, mas como era o único que tinha o tal celular, emprestou. O moço usou o Nextel e de alguma forma anotou o número de Victor.
Poucos dias depois, um rapaz chamado Rodrigo ligou no celular do garoto:
– Eu queria falar com o Victor.
– Sou eu.
– Eu sou produtor da RedeTV!, do programa da Hebe. A gente vai fazer uma matéria com o Neymar. Precisamos de um sósia dele para quinta-feira desta semana.
(Victor achou que era trote, porque nunca tinha recebido ligação de produtor nem nada).
– Eu peguei seu contato com um rapaz e fiquei sabendo que você trabalha como sósia do Neymar.
– Olha, eu não trabalho. O pessoal diz que eu pareço...
– Então, você pode me enviar algumas fotos?
As fotos foram enviadas. Rodrigo não retornou mais. Victor deixou quieto, e achava mesmo que tinha sido um trote. Mas na quinta-feira de noite, só por curiosidade, assistiu o programa da Hebe e, para surpresa dele, viu uns meninos como sósias do jogador. Naquele momento, algo aconteceu em Victor. Eu pensei: bom, não era brincadeira, eu fui mesmo convidado. Da próxima vez que um produtor me ligar, vou aceitar na hora. Ele não sabia que esta próxima vez estava tão próxima.
O professor e o comercial
Era então final de 2011 e Victor ia se formar no curso técnico de audiovisual que fizera durante o segundo semestre, enquanto ainda estava no segundo ano do Ensino Médio. Josimar, o professor de roteiro do curso técnico, viu por acaso que uma produtora, conhecida dele, postou no Facebook: Preciso de um menino que se pareça com o Neymar para casting de comercial.
O professor passou o contato do aluno à produtora e logo telefonaram para Victor. Era seleção para um comercial de 30 segundos da Fiat. A produtora encaminhou as fotos de Victor para o diretor do comercial e ele quis conhecer a figura pessoalmente. Eu fiquei surpreso porque tinha uns dez meninos no teste, não achei que seriam tantos assim. Mas eu olhei e me garanti. Pensei que ia dar certo e me dediquei muito para passar no meu primeiro trabalho como sósia. Victor lembra que a espera até chegar a sua vez demorou mais do que o teste em si. Em cinco minutos gravou de perfil e petecando bola, e foi para casa esperar pela resposta.
Victor não viu os testes dos outros meninos, só soube que um deles, Danilo Nicanor, jogador profissional do Clube Atlético Bragantino, se saiu muito bem com o domínio da bola. Eu pensei, nossa, vou me ferrar nisso. Victor sabia que Danilo havia feito trabalhos como dublê do Neymar antes. Ele era escolhido sempre que precisavam de movimentos difíceis. Por exemplo, eu fiquei sabendo que num comercial da Lux tinha que petecar a bola deitado dentro de uma banheira com água, e não é qualquer um que faz isso. Ele faz. Victor tinha consciência de que na parte do futebol não ia se sair tão bem, mas se garantia na aparência.
Foi difícil conviver com a ansiedade. Era o mesmo que esperar o resultado de uma entrevista de emprego. Passaram dois dias e nada. Três dias, nada. Victor não parava de perguntar à produtora sobre a decisão final e ela dizia para ele ficar tranquilo. Em um sábado de manhã, perto do Natal, o telefone tocou:
– A gravação é amanhã, Victor, você passou. Vou precisar que você tire as luzes e pinte o cabelo de preto, pois não podemos fazer referência tão direta à imagem de Neymar. Você topa?
– Topo!
– Então vai em um cabeleireiro que tenha nota fiscal, pinta o cabelo e me traz aqui pra gente te reembolsar.
– Mas tem problema de valor?
– Não, pode ficar tranquilo. Traz a nota que a gente reembolsa.
O cachê era de R$ 1.500 mais o valor da pintura do cabelo. Aí eu pensei ah, já tá ficando melhor do que eu imaginava. Victor foi no mesmo dia em um dos cabeleireiros mais caros da região de Alphaville, o Deville, e se sentiu celebridade por um dia. O serviço saiu por R$150, mas não fui lá só porque era o mais caro, é que nem todo cabeleireiro dá nota fiscal, e eu precisava da nota.
Domingo, por volta das 10 horas da manhã, Maria Aparecida levou o filho de trem à gravação. No grande estúdio no bairro de Pinheiros, em São Paulo, Victor, de cabelo preto, teve uma surpresa. Havia um rapaz de cabelos lisos e loiros, com jeito de surfista e porte de jogador, que também gravaria cenas para o comercial. Os dois receberam o cachê por estarem ali, mas apenas um apareceria na propaganda, pois o roteiro, ainda indefinido, ia ser modificado até o último momento.
Colaram brincos falsos de diamantes nas duas orelhas de Victor e fizeram-no calçar chuteiras roxas de cadarços cor-de-rosa. O moicano já estava no jeito. Em meia hora, a câmera gravou bem de perto as orelhas, o moicano e as mãos amarrando os cadarços. Depois voltaram, ele e a mãe, para casa. Uma nova espera ansiosa teve início, desta vez, para saber se era Victor quem entraria mesmo na propaganda.
A produtora disse que não ligaria para avisar caso Victor fosse o escolhido. Ele teria de descobrir quando a propaganda fosse ao ar. Tudo o que pensava era: Pô, eu gravei o comercial e ganhei cachê, mas de que adianta se passar o outro cara, e não eu? A agonia durou mais de um mês. Era meados de janeiro de 2012, quando Maria Aparecida, em casa, viu o comercial na TV e começou a gritar para o filho. Vem aqui, vem ver, vem ver. Ele tinha sido o escolhido, estava lá. Apareceu por infinitos dois segundos e meio, distribuídos na seguinte ordem: um segundo para as chuteiras sendo amarradas, meio segundo para a orelha esquerda com brinco de diamante falso e mais um segundo para o moicano. No mesmo instante Victor buscou o vídeo na internet e enviou a todos os amigos.
Cabelos e brincos
Foi depois do comercial da Fiat que Victor passou a acompanhar pelo Twitter as polêmicas peripécias de Neymar e seus cabelos. Uns amavam as mudanças do craque, outros odiavam, e o sósia teve sorte. Logo que pintei de preto para a propaganda, o Neymar pintou também. Além de adotar a nova cor, o jogador deixou os fios crescerem, para se livrar do moicano. Victor, como bom sósia iniciante, fez o mesmo.
Mas era preciso ir mais longe, não dava para se limitar a imitar os cabelos. A nova meta de Victor era convencer a mãe a deixá-lo furar as orelhas. Maria Aparecida dizia que só ia permitir quando ele fizesse 18 anos, dali a poucos meses.
– Mãe, o Neymar usa brinco. Você vai esperar entrar em maio pra deixar eu colocar brinco? Eu tenho que começar na escola já com a orelha furada.
– Ah, tá bom, tá bom. Mas só um furo, e só um brinco. Nada de piercing e essas coisas.
Victor fez um furo em cada orelha, ficou mais parecido com Neymar e começou o ano letivo do terceiro colegial como queria. Na academia que frequentava, o pessoal também reparou na semelhança com o craque, e um amigo, o Thiago, sugeriu:
– Oh, você viu que vai ter um concurso no Domingo Legal, do SBT?
– Não vi.
– Vai ter um concurso lá de sósia do Neymar.
– Ah, é?
– É. Se inscreve lá e quem sabe você consegue alguma coisa.
Ele seguiu a recomendação do amigo. Entrou no site do programa, tirou as fotos necessárias e fez a inscrição. Nesta altura da história, o cabelo do Neymar jogador estava comprido na parte de trás, mas não era natural. Ele colocara aplique. Dava para perceber, foi do nada, de um dia pro outro. Num dia estava curto, no outro estava enorme. Pronto: o Neymar sósia precisava de um aplique também.
Alguém comentou que na Galeria do Rock, no centrão de São Paulo, havia cabeleireiros em conta. Victor foi parar no Sena Cabeleireiros, onde uma mulher o atendeu.
– Quero colocar aplique no cabelo, atrás.
– Igual o do Neymar?
– Isso.
– Eu vi que ele colocou, e você é parecido com ele. Já sei como colocar.
O aplique saiu por R$110. Nas contas de Victor, em qualquer outro lugar próximo de onde mora, não custa menos do que R$250. Uns dias depois, como já estava ficando comum na rotina do garoto, uma produtora ligou. Era do Domingo Legal: vamos fazer o teste do concurso, você pode vir aqui? Claro que ele podia.
O concurso
No dia marcado, Victor foi de ônibus até o bairro da Barra Funda, onde pegou uma van do SBT que o levou à emissora. Lá, encontrou os outros meninos participantes do teste, mas eles eram assim nada a ver, sabe? Tinha menino muito branco, tinha um outro que era meio vermelho... Aí eu fiquei olhando e pensei: passo fácil nisso aqui.
Após o teste, a produtora disse à Victor que o perfil dele era legal e perguntou se ele tinha algum problema em desfilar de sunga.
– Não, problema nenhum.
– Então tá bom. Fica no aguardo, a gente vai te retornar.
Passaram dois dias e ela ligou para avisar que ele fora aprovado no teste. Como a exibição do programa aconteceria no domingo de carnaval, não daria para fazer ao vivo. A gravação foi agendada para uma quinta-feira e o SBT mandou um carro buscar Victor ao meio-dia na casa dele.
O garoto sentia aquele arrepio no estômago. Tinha gravado o comercial mas programa na televisão é diferente. Ao chegar no SBT, conheceu seus concorrentes: Renato, Marcelo e Danilo, de novo aquele do Bragantino, que conhecera na seleção do comercial da Fiat. O quadro do concurso de sósia abriria o programa, mas acabou transferido para o final. Os quatro garotos, bem maquiados e penteados, ficaram esperando por horas até o momento de entrar no palco. Para passar o tempo, Victor e outros três jogaram bola no camarim com cuidado para não quebrar nada.
As regras do concurso eram simples: os garotos tinham que fazer três entradas no palco. Na primeira, desfilaram com uniforme de futebol do Santos, fornecido pela emissora, na segunda, de sunga trazida de casa e, na terceira, de roupa de balada, também trazida por eles.
Eu senti uma reação positiva da plateia, ainda mais quando desfilei de sunga. Eu entrei e as meninas todas gritando. Isso é bom. Dá uma confiança. Elas gritaram mais pra mim, eu achei. Gritaram pros outros também, mas não tanto quanto para mim.
Na última parte, a da balada, Victor, identificado com uma plaquinha com o número três colada à roupa, vestia calça saruel jeans, camisa xadrez vermelha, tênis, boné branco – com o tufinho de cabelo postiço aparecendo por baixo – , óculos de sol e um enorme fone de ouvido pendurado no pescoço, bem ao estilo do Neymar. Os concorrentes estavam lado-a-lado no palco e tinham uma última missão: dançar o hit internacionalmente conhecido “Ai se eu te pego”, de Michel Teló.
Victor parecia ser o mais à vontade dos quatro e rebolava, gesticulava, fazia caras e bocas enquanto dançava. A plateia ia ao delírio. Ele estava se divertindo, desinibido, diferente do menino que fora anos atrás. Celso Portiolli enfim anunciou:
– Bom, agora é o seguinte: vocês sabem que o vencedor de hoje, o mais aplaudido aqui no auditório, vai ganhar mil reais. Meninas, vamos à votação?
(Auditório solta gritinhos)
– Boa sorte para todo mundo. Vamos começar aqui com o número um, o Renato. Palmas para ele.
(Pequena reação da plateia)
– Pois é, Renatão, parece que tem candidato mais forte que você. Palmas para o Marcelo.
(Grande reação da plateia)
– Palmas para o Victor.
(Muitos aplausos, berrinhos, aquela coisa. Ele agradece fazendo coraçãozinho com as mãos. Como eu tive mais aplausos, dei uma respirada de alívio.)
– Palmas para o Danilo.
(Pequena reação)
– É, olha Danilo, você foi muito bem aplaudido, mas foi menos que os dois ali, ok? Danilão, por enquanto não é você o campeão de hoje, obrigado pela presença. Renatão, também não foi você, mas você é muito parecido com ele. Adorei conhecê-lo. Legal. Só os dois no palco agora, Marcelo e Victor.
(Victor sorria, confiante, as mãos nos bolsos da calça)
– Agora meninas, vocês vão ter que me ajudar a escolher o mais parecido com o Neymar. O mais parecido é o Marcelo? Palmas para o Marcelo. Agora palmas para o Victor.
(Ele ri. No fundo sabia que havia ganhado)
– Olha, eu acho que já tenho aqui o resultado, mas vamos lá. Quem gostou do Marcelão levanta a mão. Agora quem gostou do Victor levanta a mão. Aí, Vitão! Tu é o nosso Neymar! Aí moleque!
Fiquei muito feliz. Mas não aproveitou direito o prêmio de mil reais. Aquele primeiro pagamento, os R$1.500 que recebera pelo comercial da Fiat, foi todo gasto de uma vez no shopping mais caro de Barueri, o Iguatemi Alphaville. Comprou dois sapatênis, uma bermuda, uma camiseta, um par de lentes de contato verdes (para ficar com os olhos da cor dos de Neymar) e lanches durante o passeio. Passou tudo no cartão de débito.
Quando consultou a conta, não tinha mais dinheiro. Pensou que havia sido roubado. Eu tinha dito para a minha mãe que ia dar R$ 400 para ela, ela tinha pedido. Quando eu cheguei em casa, depois do shopping, ela falou: cadê meu dinheiro? E não tinha mais dinheiro. Por isso, quando eu ganhei os mil reais do Portiolli, eu não saboreei, porque ela foi lá e pegou mais da metade.
Popularidade
No domingo de carnaval, quando o programa foi ao ar, Victor não assistiu. Estava na cidade de Cachoeira Paulista, acampando em um retiro católico onde não existia televisão. Foi só dar o horário do programa para seu celular registrar 40 ligações perdidas de amigos e receber um monte de mensagens. Depois do concurso veio a fama. Porque aí é mídia, é televisão. Eu fiquei conhecido como “menino do Domingo Legal”. Muitos o paravam na rua, no shopping, onde quer que pisasse. José Carlos, pai de Victor, apoia o trabalho do filho e gosta quando mexem com ele na rua: É uma emoção. As pessoas o conhecem, mas não como Victor. Conhecem pelo trabalho de sósia.
Ao observar como se comportava a concorrência, Victor sentiu necessidade de criar uma fan page no Facebook. Cerca de mil pessoas curtiram a página. Mas eu não mexo muito. Prefiro usar o meu próprio perfil, que já era bastante movimentado e depois disso começou a lotar. No Facebook, Victor soma 4.954 amigos e 18.615 seguidores. Abriu também uma conta no YouTube (NeyCover), e um site – neymarcover.com – como portfólio profissional. No Twitter, @neycover_94, os números são mais modestos, mas não menos expressivos: 2.115 seguidores. O Neymar de verdade, @njr92, é seguido por 6,6 milhões de pessoas na mesma rede social.
Poucos dias depois da aparição no SBT, Victor conseguiu outro teste em uma agência e Maria Aparecida o levou até o centro empresarial de Alphaville. A gente sem carro, teve que pegar ônibus para ir até lá. Nesse dia mesmo é que eu acreditei, que eu vi. As pessoas na rua gritavam Neymar! Neymar! E ele acenava. Uma mulher se aproximou e pediu uma foto tremendo, quase chorando.
– Ai, Neymar, tira uma foto comigo! Deixa eu tirar uma foto com você? Por favor.
– Vamos, a gente tá atrasado. Não dá tempo – dizia a mãe.
(Victor não falava nada)
– Não, espera só um pouquinho. Neymar, meu marido é santista, ele vai adorar a foto.
– Não pode, tem horário! – insistia Maria Aparecida.
Ele só abriu a boca para sorrir. Tirou a foto e não disse que se chamava Victor e não Neymar. Tirou a foto e seguiu com a mãe para a agência. Mas bem que ela avisou. Não deu tempo. Ele perdeu o horário e o trabalho.
Após o sucesso inicial, Victor teve breves aparições na televisão. Uma delas foi no Esporte Fantástico, da Record. Ele estava na arquibancada da Arena Barueri assistindo Santos contra Oeste, quando encontrou, por acaso, o rapper Emicida no meio da torcida e os dois foram entrevistados pelo repórter esportivo que estava ali perto.
Victor também foi visto no programa matinal infantil Patati Patatá. Havia pouco tempo que o garoto integrava a equipe e estava ensaiando para fazer os primeiros shows pelo Brasil como palhaço Patati. Então o convidaram para uma participação especial no programa, vestido de Neymar. Ele aceitou e eles improvisaram uma esquete. O programa era ao vivo e Victor soube que eles ultrapassaram a audiência do Mais Você, da Globo. A Ana Maria Braga fez quatro pontos no Ibope, nós fizemos cinco.
Talco para pés
Victor ensaiou alguns dias para atuar em eventos como o palhaço Patati, embora não tenha conseguido se apresentar nenhuma vez. Foi cortado. Bem na semana em que começaria a fazer os shows pelo Brasil disseram que ele não precisava mais ir. Fiquei um pouco chateado porque eu queria, eu estava ensaiando e me dedicando para poder fazer. Chegou a achar que nem teria mais o jogador em sua vida, pois não daria tempo de trabalhar como sósia. Mas o personagem Patati é que se foi e o papel de Neymar ficou.
O sósia ainda não havia sido cortado e ensaiava como Patati quando ligaram da produtora O2 pedindo uma foto de seu pé. Ele enviou e logo foi aprovado. Ficou sabendo que se tratava de um comercial do talco Tenys Pé, e que atuaria como dublê de Neymar. Marcaram o dia da gravação e desta vez quem o acompanhou foi o pai, José Carlos.
Pai e filho foram antes das sete horas da manhã até a O2, no bairro de Vila Leopoldina. De lá, a produtora os levou até a cidade de Santos, onde estavam marcadas as gravações com o jogador. E era o dia em que eu ia conhecer o Neymar pessoalmente. Imagina como eu estava.
Chegaram por volta das oito da manhã no litoral. Desceram no centenário Clube dos Ingleses, onde a produção já se preparava para gravar. Àquela hora, Neymar treinava a uns cinco quilômetros dali. O Clube dos Ingleses estava aberto ao público normalmente, e muitos dos sócios que sabiam que o jogador passaria por lá já o esperavam.
Foi engraçado. Quando eu cheguei com a produção da O2, um senhor que estava jogando tênis se aproximou e disse: Cara, eu sou muito seu fã. Parabéns pelo talento. E o pessoal veio tirando foto, gritando, me chamando de Neymar.
Depois de tomar café da manhã, Victor foi matar tempo próximo à piscina. Um menino chegou perguntando:
– Ei, você é o Neymar?
– Não, não sou.
A regra adotada pelo sósia é a seguinte: se a pessoa realmente acredita que ele é o Neymar e pede para tirar foto, Victor não abre a boca, não acaba com o sonho da pessoa. Muita gente tirou foto comigo achando que era o Neymar. Acho que mais de cem. Mas se a pessoa pergunta diretamente, ele conta que não é o jogador. O mesmo vale pro autógrafo. Ele não assina como Neymar.
Neymar e Neymar Júnior
Os figurantes do comercial – Victor, inclusive – se reuniram em uma longa mesa do clube, ao lado de um grande pilar. Eles conversavam enquanto a estrela do dia não chegava. Estavam na maior expectativa. Victor sentou-se em uma cadeira próxima à passagem, para ver de perto quando o craque surgisse. Mas a espera foi tanta que Victor acabou por trocar de lugar. Foi bem neste instante que o jogador apareceu, cercado por seguranças e acompanhado pelo Neymar pai.
Ele passou perto de onde eu estava sentado momentos antes. Eu iria ver bem de frente. Mas não foi o que eu esperava. Ele é baixinho, magrinho, ainda mais em comparação com aqueles seguranças 4x4. Ele tem 1,78m e eu tenho 1,86m. Eu esperava uma pessoa maior, né? Ele cumprimentou geral o pessoal dizendo E aí, e aí?! E foi direto para o camarim. Depois começou a gravar.
Victor não se aquietou. Perguntou para a produtora:
– Quem pode entrar ali na área de gravação?
– Só o pessoal da produtora e você.
– Sério?
– Sério. Você quer entrar?
– Quero. Mas eu estou com vergonha. Vou chegar assim?
Ela o acompanhou até o local onde o jogador estava gravando. O segurança abriu o portal e não falou nada. Na pausa entre uma cena e outra, Neymar cumprimentou Victor pessoalmente.
– E aí, moleque, beleza?
– De boa.
Quando ele grava, geralmente tem um sósia junto, ele tá acostumado com isso. Ele já imaginava que ia ter alguém parecido.
Neymar foi novamente para o camarim, onde se arrumou para a cena seguinte. Saiu só bermuda, sem camisa, para gravar na piscina. E aí na época, como eu malhava, e tava calor, eu tirei a camisa também. O pessoal começou a olhar meio assim, comparando a gente. Eu vi até duas mulheres a uma certa distância comentando.
Victor perguntou à produtora:
– Será que dá para tirar uma foto agora?
– Faz assim: coloca a camiseta e vai lá pro camarim, porque você pode entrar.
Ele seguiu a recomendação e entrou no camarim. Era quase uma pousada, de tão grande. Era dividido em dois quartos. Lá dentro estavam um fotógrafo, o maquiador, outra produtora e o cabeleireiro, que perguntou para Victor:
– Como é com o seu cabelo?
– É complicado porque toda hora o Neymar muda, e eu tenho que ficar mudando também.
Foi só Neymar entrar no camarim, o cabeleireiro abriu a boca:
– Ô, Neymar, você tem que parar de mudar tanto o cabelo que o menino aí tá até reclamando.
Eu acho que ele ficou meio bravo, porque respondeu dando risada, mas bem sério:
– Você não quer trabalhar? Você não quer ser sósia? Tem que mudar o cabelo também.
Victor ficou quieto, e o cabeleireiro língua solta:
– Vamos tirar uma foto, vocês dois?
A gente tirou duas fotos e deu aquela emoção. Coloquei no Face. Victor gravou pequenos trechos representando Neymar de costas, de lado e cenas que só mostravam partes do corpo. Depois de muitas horas, no final do dia, Victor sentou-se na arquibancada de um ginásio do clube. Perto dele estavam Neymar pai e o dono do Tenys Pé. O sósia puxou assunto com o pai do jogador:
– E aí, muito trabalho?
– Vixi, demais. Tá uma correria.
– Esse moleque aí é esperto – meteu-se na conversa o dono do talco, apontando para Victor – ele deve estar arrasando com a mulherada.
Victor riu e comentou com Neymar pai:
– É, se soubessem como é difícil... a quantidade de crítica que se recebe...
– Bem-vindo ao clube.
Sempre tem o pessoal invejoso que critica o trabalho. Todo mundo que tá na mídia é criticado. Hoje já não sou muito mais. O povo tem uma inveja enorme. Victor recebeu R$ 1.500 pelo dia de trabalho. Chegou em casa de madrugada.
Trabalhos e futuro
Depois do comercial do Tenys Pé, Victor fez eventos corporativos e apareceu várias vezes na televisão. Cada participação em programa rendeu R$150. No Melhor do Brasil, comandado por Rodrigo Faro, na Record, foi figurante de um dos quadros e viu de perto a ginasta Daiane dos Santos. No Legendários, de Marcos Mion, na mesma emissora, o sósia foi vestido de jogador e ficou no palco ao lado de outros sósias de esportistas, para dar um clima de Olimpíada, pois era época da competição em 2012.
O Balanço Geral, também da Record, o chamou na mesma época para participar do programa no dia da estreia do futebol nos Jogos em Londres. Na segunda aparição como figurante do Legendários, em novembro, Victor conheceu Ivete Sangalo e deu um beijo no rosto dela. Na RedeTV!, onde tem o melhor camarim de todos, esteve no SuperPop, de Luciana Gimenez, e fez figuração de palco ao lado da Miss Bumbum enquanto o grupo Os Leleks cantava seus hits.
Ao mesmo tempo em que aceitava os convites, Victor seguia com os estudos. Formou-se no Ensino Médio em dezembro de 2012, com dezoito anos, e agora cursa Audiovisual na Anhembi Morumbi. Escolheu o curso porque seu mundo é o das telas. Ele gosta de câmeras. Pensa em ficar na frente delas, ser ator de novela e filme. Mas sabe que ainda não o é. Eu sou um dublê por enquanto. Quer fazer aulas de teatro para tornar o sonho mais próximo. Caso não dê certo, tudo bem. Também será feliz sendo produtor de TV, como um daqueles tantos que ligaram para ele.
Em março deste ano, Victor provou por um dia o gosto de gravar novela. O sósia foi contratado como dublê da nova novela global de horário nobre, Amor à Vida. Victor tinha mandado suas fotos para figuração na novela das seis, Guerra dos Sexos, mas a produção as arquivou. Tempos depois se lembraram dele porque precisavam de alguém para fazer uma cena que Neymar, participação especial na novela, se recusou. Seria gravado em Santos, de novo, para facilitar a vida do jogador. Mais um cachê de R$150. Eu aceitaria o trabalho mesmo se não tivesse cachê, só para estar perto dele.
A cena consistia em Neymar (o sósia neste caso) ser assediado por uma fã. O detalhe: Victor fez a cena tomando banho. Totalmente despido. Não fiquei com vergonha porque a câmera gravou como se fosse alguém espiando, com a porta meio aberta só. E o box estava embaçado.
Além da aparência
Victor namora a estudante de biologia Juliana Staziak, 18 anos, há poucos meses. Eles se conheceram na virada de 2012 para 2013, quando estavam no mesmo condomínio na Praia Grande. Juliana é ciumenta, mas se acostumou com a popularidade do namorado. Tento não olhar muito o Facebook dele porque me estresso. As meninas ficam dando em cima. Ele posta alguma coisa e em um minuto cem pessoas curtem. Juliana sempre foi fã de Neymar e já o viu pessoalmente em um aeroporto. Eu não acho que os dois se parecem. O Victor acha bom que eu gosto dele como Victor, e não como Neymar.
Apesar de não ser uma promessa do futebol brasileiro, Victor gosta do esporte. É são paulino, mas também torce para o Barueri desde 2007. Hoje divide seu tempo entre a namorada, a faculdade, os amigos, as baladas, a família, os compromissos como sósia e a Torcida Gurreiros Barueri, onde ocupa o cargo de diretor de caravana. Estamos com um projeto de criar uma liga de torcidas para acabar com a violência nos estádios. Vamos reunir as do interior e as do Grande ABC para fazer uma passeata pela paz. Porque como tá chegando a Copa do Mundo, tá complicado para todos.
Maria Aparecida vê o filho se desdobrando entre tantas atividades e o acha muito exclusivo, muito ocupado. Eu digo que Victor quer ser o rei. Ele está em tudo, participa de tudo, meio artístico, política, futebol... Ela conta que uns políticos de São Paulo o convidaram para se candidatar a vereador nas eleições de 2012, e que acharam uma pena ele ainda não ter 18 anos. Victor ficou animado. Disse para Maria que se pudesse, disputaria sim, mas queria ser deputado.
A mãe agora está na expectativa de assistir Victor como sósia na novela das nove. Ele luta, corre atrás, conhece muitas pessoas. A portas não têm aberto tanto mas, quando acontecer, vai ser certeiro. Ele tem competência. José Carlos, o pai, lembra do dia em que conheceu Neymar no comercial em Santos, e faz a inevitável comparação: ele é bem caladão, o oposto do meu filho. O Victor fala até demais, é carismático, fácil de arrumar amizade, e tem uma lábia...